Batotas no pós referendo na Irlanda  

Sendo a unanimidade dos países membros, um requisito obrigatório para revogar tratados europeus, a vitória do Não no referendo da Irlanda, sentencia de morte o Tratado de Lisboa. Pode ser discutível se um país, qualquer que seja, numa união alargada em que a adesão é voluntária, deverá poder decidir por todos. Mas esta foi a regra adoptada pelos países fundadores e sucessivamente renovada. Não têm pois de que se queixar. Em democracia ganha-se e perde-se. A tentativa de fazer aprovar o Tratado de Lisboa à margem da participação popular, esbarrou na obrigatoriedade constitucional da Irlanda, de submeter a referendo a revisão do Tratado. E os Irlandeses disseram não a este Tratado, por eles e por todos os outros que estavam contra e não puderam pronunciar-se. Respeite-se!

Agora desenha-se um cenário de batota eleitoral.

Aqueles que não quiseram o referendo nos seus países, querem um novo referendo na Irlanda. Aqueles que nos seus países recusaram debater, esclarecer, discutir o conteúdo do Tratado, querem discuti-lo na Irlanda. Aqueles que recusam UM referendo nos seus países, querem DOIS (ou os que forem necessários, até o Sim ganhar), na Irlanda. Ou então afastar temporariamente a Irlanda da União Europeia.

Mas também não me esqueço das outras batotas. Também o PCP em Portugal quando da derrota do Sim ao aborto no primeiro referendo, pretendia desrespeitar a vontade popular e fazer aprovar na Assembleia da República, o que foi derrotado nas urnas. A democracia não tem um sentido único ou serve apenas para ser usada quando nos convém.

O que parece ficar claro é que regra da unanimidade não tem futuro e que acaba por ser bloqueadora. Mas também a decisão não pode ficar nos directórios políticos com os povos à margem do processo constitutivo da Europa.

Para sair com dignidade democrática deste imbróglio, só vislumbro uma saída (e não creio que esta seja uma ideia minha): iniciar um novo processo, dando poderes constituintes ao novo Parlamento Europeu e os países de seguida aprovarem ou rejeitarem, por via parlamentar ou por referendo, o texto constitucional, sendo que os partidos, se devam apresentar às próximas eleições europeias, com clareza política sobre o modelo de união política, para os eleitores não serem enganados.

Até lá continuará o Tratado anterior a vigorar e não vai morrer ninguém por isso.


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