A luta dos professores (II)  

Mais de cem mil professores na rua não podem significar outra coisa, em primeiro lugar, que não seja uma profunda insatisfação e raiva com a Ministra da Educação. A grande conclusão a retirar depois desta e das anteriores grandes manifestações de rua de trabalhadores e dos protestos das populações contra o fecho das urgências e dos serviços de atendimento permanente, é que os portugueses não estão a gostar de ser governados com tamanha arrogância e tanta insensibilidade social. Embora isto não chegue para acabar com as habituais “alternâncias governativas” entre o PS e o PSD, espera-se que pelo menos sirvam para acabar com as malfadadas maiorias absolutas

O protesto dos professores tem razões de ser. Os professores não são os maus da fita do sistema de ensino como a ministra, em tempo e subliminarmente, tentou fazer passar e que mereceu de resto a justa indignação dos professores, a que nem as desdobradas justificações de última hora da ministra a uma diligente e generosa comunicação social, conseguiu dar a volta e apagar da memória de todos nós, as desastradas e chocantes afirmações feitas anteriormente sobre os professores.

Querer responsabilizar os professores pelo estado actual de ensino é desonesto. Os professores não podem conviver com as culpas todas. Aos professores não podem assacar culpas que são de todos: da sociedade, do sistema, dos pais, dos alunos e principalmente dos responsáveis pela governação em Portugal. Se um aluno reprova, se um aluno não vai à escola, se a escola não dá saídas profissionais, se os responsáveis não investem a sério na educação, a culpa não é dos professores. A ministra teve esse condão: de fazer crer, instalando a dúvida nos próprios que a culpa é deles e só deles. Os professores têm razões para demonstrar na rua a sua insatisfação e raiva pela ministra.

De resto mantenho o que disse. Todos os agentes educativos devem ser avaliados: as escolas, os professores, os alunos, os dirigentes. Defendo como princípio que o aluno não deva ser retido na sua progressão escolar. Isto não quer dizer que se deva instalar o laxismo ou a irresponsabilidade. Quer dizer que a escola, o professor, o sistema, devem fazer tudo, para que o aluno consiga atingir os objectivos mínimos. E o professor, o dirigente escolar, a escola, deverão justificar muito bem o fracasso de um insucesso escolar. É isto que devia estar em causa neste debate: como defender melhor a escola pública inclusiva, responsável e competente? E isso por si só fundamenta a avaliação da escola e dos professores: o que fazem todos para que o sucesso ou insucesso escolar aconteça.

Por exemplo, perante um aluno problemático a escola terá de premunir-se de uma estrutura de compensação que repare as dificuldades e não renunciar, retardando ou abandonando os alunos à sua sorte. É isto que deve fazer a diferença na escola pública. A escola pública é a escola de todos. Também de alunos com mais problemas ou mais dificuldades. Está na altura de colocar os focos nos alunos.

Infelizmente as coisas não têm sido assim por manifesta incompetência e arrogância da ministra e por isso, e só por isso, é que tenho defendido a sua demissão … para apaziguar os ânimos e centrar a discussão, sem ruído e sem interferências alheias e desproporcionadas, no plano do que interessa discutir; o conteúdo efectivo da reforma educativa.

Por fim, não poderia de deixar de insistir, tenho sérias dúvidas do que move verdadeiramente a maioria dos professores: se é o direito à indignação, compreendo-os e acompanho-os. Se é a defesa de interesses pessoais e corporativistas, compreendo-os, mas não contem comigo. Se é a defesa da escola pública, estou de corpo e alma com eles. Mas, como disse tenho as minhas perplexidades. E confesso que me desgostou ouvir professores presumidos, referirem que nunca antes participaram numa manifestação de rua, como se em trinta anos de democracia, nunca tivesse havido um momento para um protesto ou uma celebração. Ou que “dirigentes” associativos tivessem mentido publicamente e com toda a desfaçatez. Ou ainda alguns não tivessem sido capazes de dizer porque estão numa manifestação ou o que realmente os inquieta nas reformas que estão a ser levadas a cabo.



8 comentários

  • Flor  
    11 de março de 2008 às 22:53

    Acabei de ler teu post com atenção. Em primeiro observei o numero elevado de professores a manifestar; isso é muito bom, pena que não estejam sempre na rua sempre quando é preciso.

    Se comprendi bém quer dizer que até hoje eles não eram avaliados, nunca.
    Posso falar te daqui, pois por ca os professores da escola primaria até o lyceu são avaliados por inspectores da academia, assistindo as aulas do professor avaliado; esse professor conhece o dia e a hora da sua avaliação; assim os professores são notados e torna se mais facil para os directores das escolas planifiar as aulas conhecendo melhor os professores.

    Um beijinho

  • Fernando  
    12 de março de 2008 às 12:03

    até agora não havia um sistema de avaliação a sério e a ministra quer à "pressão" avaliar os professores ainda este ano, depois de ter feito afirmações muito "mázinhas" sobre os professores. Mas a avaliação é apenas um dos problemas na reformas em curso. Em minha opinião um sistema de avaliação das escolas e dos professores justificam-se para termos uma escola melhor para melhorar a qualidade do ensino. Não conheço o sistema em França. Esses inspectores de que falas são o quê na estrutura da Escola?

  • Flor  
    12 de março de 2008 às 21:51

    A França como sabes esta dividida em 95 departementos e em 22 regiões. Uma académia corresponde mais ao menos a uma região, e é gerida por um rector e cada departamento é gerida por um inspector de académia. A académia mete no terreno a politica escolar definida a nivel nacional.

    O rector ocupa se da harmonização dos estudos superiores, universidades e é uma autoridade sobre as escolas primarias, colégios e lyceus.

    O inspector da académia gere a organisação escolar, o pessoal essencialmente das escolas primarias, a vida escolar e a escolaridade, a organização dos examens.

    Procurei isto pelo internet.

    Lembro me quando andava na escola, ver no fundo da sala aquele inspector; na altura pensavamos que ele estava ali para nos (alunos), e estavamos todos caladinhos e quietinhos enquanto ele la estava.

    Um beijinho

  • Anónimo  
    17 de março de 2008 às 10:58

    Lamento discordar deste post, não no geral mas em duas questões concretas.
    1ª - Há nele a intransigente defesa da avaliação, sendo este um objectivo em si. Avaliar por avaliar. Apenas e só… avaliar. Avaliar para reduzir custos, porque a educação é para os neoliberais que se apossaram do Partido dito Socialista uma disciplina que tem que dar lucros. [Esta corja mede o lucro, apenas pela redução de despesa, não pelos efeitos que a educação possa ter na formação dos portugueses]
    Lamento Fernando, mas a avaliação, sobretudo a que é patrocinada por este governo mais não visa que criar pretextos para precarizar ainda mais a vida dos portugueses. Se efectivamente houvesse a intenção de melhorar o nível dos nossos professores, a intervenção far-se-ia no alicerce e não no telhado. Quero eu dizer com isto que é inconcebível avaliar profissionais, sejam eles quem forem, sem antes proporcionar ou intervir ao nível da formação desses mesmos profissionais. Por outro lado não se entende que existam em Portugal escolas de formação de professores e estes terminem a formação com a classificação de aptos sem contudo estarem habilitados. Então a escola não é responsável? Então a escola não se apercebeu da hipotética inaptidão dos professores quando patrocinou estágios, quando os colocou à frente de turmas com alunos reais? [A escola considerou-o apto para quê, ou porquê? Não é a escola responsável? É! Então porque não incide a acção aí, na base, no sitio onde se pode cortar o “mal” pela raiz?]
    Meu caro Fernando esta avaliação visa forçar o surgimento de indicadores falsos, absolutamente falsos, no que à formação dos portugueses diz respeito. Conheço um caso, de entre muitos em que uma senhora de sessenta anos, residente numa aldeia transmontana, que vive da terra que trabalha, a quem foi proposto e aceite por ela formação em computadores. Assim a senhora todos os dias se desloca da aldeia até à cidade, ao centro de emprego onde frequenta um curso, renumerado evidentemente, para ter formação de algo de que nunca vai precisar, (não é conservadorismo da minha parte, é a analise da realidade). Contudo ela ganha, da horta retira menos proveitos que da formação e o governo vai inscrever mais um número nas habilitações dos portugueses. Francamente… Isto é gozar com a nossa cara!
    1º a) – Considero a avaliação de um modo geral falaciosa. O Fernando, que trabalhou como eu na PT, conhece o tipo de avaliação que por lá se fazia e sabe perfeitamente para que servia… A avaliação para ser séria não pode basear-se em itens falaciosos e muito particularmente em itens de natureza filosófica ou ideológica. Repare-se que, como muito bem denunciou Francisco Louçã, os critérios insertos na proposta de avaliação daquela escola de Leiria… [E nos sabemos que as escolas, como de um modo geral as demais instituições estão minadas por displicentes colaboradores disponíveis para servir o poder seja ele qual for, a troco de uma qualquer mordomia ou um simples posto na hierarquia. São os serventuários, os cães de fila do poder.]

    2º - Parece-me despropositada a referência ao facto de muitos professores afirmarem que nunca estiveram presentes em manifestações, e questionar a “falta de razões” para se terem manifestado.
    Evidentemente que não é de entendimento fácil, porém é perfeitamente secundário, no que ao caso presente diz respeito.
    Não se esqueça Fernando que parte substancial das pessoas que estiveram presentes naquela grandiosa manifestação, a maior de todas em Portugal - falo do primeiro 1º de Maio em Liberdade em Portugal, mais de um milhão de pessoas na Alameda… - parte dessas, uma grande parte não teve, escassos meses antes, qualquer relutância em apoiar e manifestar solidariedade para com aqueles que nesse então nos proibiam de estar ali, ali naquela Alameda a dar VIVAS À LIBERDADE. Não deixamos, os que sempre estivemos contra os que nos cerceavam a liberdade de saudar a sua presença…

    João do Carmo Lopes

  • Fernando  
    17 de março de 2008 às 13:14

    Sê bem-vindo João Lopes. Se bem depreendi do teu post parece que já não estàs na PT. Interpretei bem? Quanto ao resto tens razão num aspecto: há uma defesa intransigente da avaliação. Quanto ao resto já discordamos em algumas coisas. Mas é normal discordar de mim quem debate comigo. Sou do contra. Eu faço um pouco o papel de advogado do diabo em todas as situações. Sobre o tema: avaliar é bom e é preciso. Sem avaliação não há progresso. Não avaliar para punir mas avaliar para melhorar e distinguir. No caso da escola defendo a avaliação para protecção dos alunos. Eu não quero uma escola -enquanto pai que teve um filho "difícil" na escola -por razões de "saúde", um rapaz com uma espantosa agitação interior, "mental e motora" e portanto com enormes dificuldades de concentração nas aulas e no resto -que as soluções que apresenta para alunos "problemáticos" seja abandonar o mesmo, fazê-lo mudar de escola e por fim, abandonar os estudos, prematuramente ( o meu filho mais velho ficou pelo sétimo ano, em pleno século XXI). Este meu rapaz, hoje com 27 anos é operário na industria naval, nos estaleiros navais, mas é tão-só o mais inteligente, repito, o mais inteligente, o mais culto, repito, o mais culto, da família e não somos, todos, digamos, propriamente uns iletrados. Mas este é apenas um caso que conheço bem. Eu quero que a escola e os professores sejam também avaliados pela taxa de sucesso escolar, sem subterfúgios. Os professores que quero na escola pública são os que revelem paixão pelo ensino (felizmente são a maioria, quero crer) ...mas também há os outros. E como fazer esta distinção? Pela avaliação, naturalmente: da escola e dos professores. Bem dizes tu mas este modelo proposto pela ministra é o mais adequado e é bem intencionado? Bem ... sobre isso nos dois posts que fiz (peço-te que leias o post anterior) a minha posição é clara. Não é, concerteza. Mas, insisto, uma avaliação da escola e dos professores, para a defesa da escola pública e dos alunos, é absolutamente indispensável. O pretexto ou as intenções da ministra e do Governo não nos deve fazer esquecer o essencial: a necessidade de repensar o sistema de ensino em Portugal para defender uma escola pública de qualidade e integradora. E para isso há discutir os conteúdos concretos e as alternativas da reforma do ensino.

  • Fernando  
    17 de março de 2008 às 14:16

    João Lopes acabei por esquecer-me de dizer o que pretendia quando falei o problema dos alunos "problemáticos" (mas também dos outros, claro); é o percurso de vida dessas pessoas (e do país, enfim)que os professores e a escola estão a decidir. Por isso é que me bato por uma escola pública de qualidade. É preciso mantermos um certo equilíbrio quando falamos destas coisas, em minha opinião, e não alinharmos acriticamente com todos os protestos.

  • Anónimo  
    17 de março de 2008 às 17:33

    Já não estou na PT, vai para 3 meses.

    Quanto ao resto, a minha opinião é: Avaliar sim, mas com tempo e a tempo e nunca Avaliar porque sim!
    Repito antes da avaliação propriamente dita há algo mais a fazer e sobretudo não aceito que a avaliação não seja uma razão para melhor a escola mas sirva de pretexto para economizar.
    Tou farto da ditadura dos economistas.
    Quero politicos a governar o país, não economistas!
    JCL

  • Fernando  
    18 de março de 2008 às 10:53

    De acordo JCL.

    Na sequência da reunião do Bloco com a FENPROF, Louçã afirmou que "vamos apresentar uma proposta no parlamento visando "a suspensão da avaliação, substituída por uma avaliação concentrada sobre o principal problema da educação, QUE É O INSUCESSO (sublinhado meu)e a integração dos professores contratados na carreira docente ...".

    É isto mesmo que tenho defendido.

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