Nem todos os crimes são criminosos
Passamos de um extremo ao outro com facilidade. Alguma esquerda então, meu Deus! Agora parecem estar na primeira linha da condenação dos pequenos delitos. Em nome da igualdade na justiça, que é inquestionável, pede-se a cabeça, salvo seja, de quem assalta uma vacaria para roubar uns ferros velhos, um pequeno furto num supermercado para satisfazer uma necessidade básica, o roubo de um livro, o furto de um MP3, eu sei lá mais o quê!..
De repente, parece que certa disposição para determinados tipos de "crime" ou "violência" não se encaixam nas dinâmicas sociais, na exclusão social, nas questões socioeconómicas e culturais, numa complexa rede de organização social que compreende uma divisão social e justifica a luta de classes.
De repente parece que alguma esquerda se esqueceu do que se convencionou chamar de "violência estrutural" que nasce e cresce com as desigualdades sociais, com a fome, o desemprego, e outros problemas sociais.
De repente parece que não são ou foram estes processos que atiram certos grupos ou para a consciência revolucionária ou para a delinquência pura e dura.
Não defendo o crime claro, mas não alinho no politicamente correcto, da condenação ruidosa, sem mais, sem alinhavar umas palavras, contra o senso comum, que pede sangue e mão pesada sobre os criminosos, confundindo a natureza e a dimensão dos crimes.
Bem e não vou falar dos crimes de colarinho branco, mais desculpáveis pela sociedade, infelizmente de que a pequena criminalidade.
Eu que sou um critico das religiões, não posso deixar de saudar a afirmação da Igreja, para uma certa contenção e contra qualquer campanha xenófoba, a partir dos últimos crimes, praticados por imigrantes ou por pessoas da comunidade cigana.
13 de agosto de 2008 às 12:22
Fernando, eu não sei se me estás a meter nesse saco, por causa de um post de ontem, mas eu senti-me algo "atingida". Só por isso me sinto na obrigação de clarificar, né??
O meu post,é dele que falo, obviamente, não falava em nenuhum lugar no "crime" de assaltar uma vacaria, roubar um chocolate, nem tãpouco fazia ou omitia uma análise das causas sociais da delinquência (da pequena ou da grande).
Do que falava e parece que de uma forma entendível, mas nunca somos bons juízes em causa própria, era do crime de dois adultos levarem um puto de 11 anos a assaltar o que quer que seja.
E de quaqluer forma o que me parece claro é que, mesmo estes dois crimes, são de gravidade diferente, passíveis de penas diferentes e ambos para serem julgados com acesso á mesma justiça.
E a justiça é feita em tribunais e não na rua.
Penso que o meu post de ontem depois dos dois que tinha colocado sobre o assassínio do sequestrador de Quinta Feira, não poderia dar azo a outra quaqluer interpretação. Mas lendo o teu post não tenho tanta certeza disso. E sinceramente dando azo a outras interpretações terei que o clarificar.
Se das minhas palavras e isto é mesmo um pedido de ajuda, se pode presumir que estou a branquear a morte de uma criança de onze ano, ou a condenar sem julgamento os assaltantes, diz mesmo que eu voloco uma coisa a mendar aquilo. Era o que mais me faltava era correr o risco de alguém poder pensar que eu acho que a pena de alguém que rouba um ferro velho pode ser a mesma de quem mata.
13 de agosto de 2008 às 12:50
o teu post pareceu-me claro e genericamente estou de acordo com ele, pese, digo eu, porque não sei se estou a avaliar bem, parecer-me, que ousar invocar as causas sociais, não para justificar mas sim compreender a natureza de certos crimes, são essas invocações quase um crime, ou não tenham cabimento quando analisamos este tipo de criminalidade.
Quis apenas lembrar isso. Às vezes mesmo sem querermos somos embalados em cantilenas do politicamente correcto em nome, precisamente, de não ser politicamente correcto. Não sei se me faço entender. É que foram a compreensão de alguns de muitos destes fenómenos que fizeram quem sou hoje e que são um dos traços que marcam um posicionamento de esquerda, para lá da propaganda, a que não somos insensíveis, que todos os dias nos entram pelas televisões adentro.
13 de agosto de 2008 às 17:22
Não quero enfiar a carapuça, nem me considero o “alvo predilecto” da tua critica, contudo não me parece que não “alinhar” pelo branqueamento do crime tendo como justificativa as “dinâmicas sociais”, a “exclusão social”, as “questões socioeconómicas e culturais" ou a “complexa rede de organização social”, possa de algum modo consubstanciar um “virar de casa” ou uma rendição ao “politicamente correcto”.
Nada disso! Recordo que tenho presente na minha análise como aliás já deixei num comentário a outro post a citação de B. Brecht, creio que é Brecht, que afirma «do rio que tudo arrasta dizem violento, mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem».
Evidentemente que na base dessa criminalidade, estão as questões sociais. Sem duvida! Entender e compreender as razões dessa criminalidade não significa apesar disso pactuar com ela ou branquear a acção. Até porque essa criminalidade nem sequer é selectiva, tanto assalta um desgraçado que “suou as estopinhas do Algarve” para ganhar uns míseros tostões como assaltam um capitalista. Aliás assaltam mais os primeiros que os segundos.
Para mim a questão é clara, esta criminalidade é profundamente nefasta ao movimento social que de uma ou de outra maneira (vê lá que eu ainda acredito nisto!!) há-de destruir esta organização social e sobre os escombros construir uma sociedade mais justa.
Esta criminalidade é individualista, profundamente egoista e está longe de servir para saciar a fome ou contribuir para a consciencialização das pessoas, antes pelo contrário.
Gostava que reflectisses e tentasses vestir o papel da vítima (atenção eu escrevi VITIMA = Alvo da afronta) deste caso concreto: Em 1981, estava eu no serviço militar obrigatório, portanto sem receber cheta e partilhava um quarto alugado em Lisboa com a minha companheira. Vivíamos do trabalho dela então jovem professora em Alcântara. Um belo dia, desse já longínquo Novembro ela recebeu o ordenado e o 13ª mês… creio que tudo junto rondava os 80 contos, entrou no autocarro e quando saiu já não tinha um tostão.
Imaginas o desespero que ela sentiu?
Sabes o que foi necessário para honrar os nossos compromissos, e não eram poucos?
Não sei, provavelmente quem nos roubou, precisava do dinheiro, provavelmente…
Para não acertar com o “coro da direita reaccionária”, nem alinhar “na condenação ruidosa” deveríamos, até porque na altura militávamos os dois na UDP, calar e compreender o ladrão, que coitado fez das tripas coração para nos aliviar daquela quantia…
Pois, eu para este peditório já dei!
Meu caro amigo, penso que no essencial estamos de acordo, pode haver ligeiras divergências na análise. Eu também condeno toda essa histeria e tudo o mais que vem ao cimo quando estas coisas acontecem. Absolutamente deplorável! E não sou insensível às razões de base, aquilo que gera toda essa pequena criminalidade, contudo recuso branquear essas acções, sendo que ao faze-lo não legitimo nem dou cobertura a determinadas vozes que aproveitando o sucedido reclama por mais disciplina, mais ordem, mais policia, mais prisão, mais sangue, mais mortes se necessário. Não! Esse não é o meu combate, mas ignorar e branquear também não contribui para alterar este estado de coisas, antes pelo contrário.
Não aceito que, para não alinharmos com uma vozearia conservadora, retrógrada e sei lá que mais nos esqueçamos de ver os dois lados da balança. Meu caro no essencial o meu lamento vai direitinho para quem reclama, e bem diga-se a propósito, contra o uso despropositado e desproporcional da força (e das balas) pela GNR e não tem uma única palavra de condenação da acção, do crime. A nossa autoridade moral estará sempre seriamente abalada enquanto continuarmos a escamotear e a não ver o que não nos convém.
Não sou adepto da polícia omnipresente, da musculação do regime ou d a sua militarização. Não! E não aceito que qualquer bem material justifique uma vida. Nada o justifica. Porem nada justifica o silêncio sobre o delito, pequeno ou grande.
Aquilo a que se chama roubo, só deixará de ser crime quando resultar da acção concertada e massiva dos povos, até lá é crime!
Quero dizer-te que tenho serias dúvidas sobre quem faz a apologia do “politicamente correcto”. Se eu que sem complexos condeno uns e outros [sem esquecer evidentemente a proporcionalidade e a razão social] se outros que, por pruridos ou preconceitos, resolvem calar ou fingir que não vêm, que não observem, que…
José Carrilho
13 de agosto de 2008 às 20:17
Há uma parte na leitura dos jornais que sempre passei à frente que são as notícias sobre acidentes. agora acontece o mesmo com as notícias sobre assaltos e roubos. não gosto destas notícias pronto, nem gosto da forma sensacionalistas como são tratadas e dos apelos ao "sentimento", se é que lhes posso chamar assim.
creio eu que nada do que se passa agora, nestas matérias, não se passasse antes. mas agora parece moda ...à falta de outras notícias ...e de medalhas nas olimpíadas, dar especial ênfase a estas coisinhas, digo eu ...
se há uma diferença entre nós, repito, se há, é que eu não dou nenhum relevo a estes casos e se me pronuncio é porque me parece que o país está transformado numa espécie de jornal 24 Horas, cujos factos de relevo são os acidentes, os crimes, a vida da socialite ...
e se também entendo, como não podia deixar de ser, que qualquer crime, de qualquer natureza e dimensão, não são inimputáveis, seja a quem for, me parece que estamos todos (e sublinho todos) embalados nesta "histeria colectiva" do medo.
mas se calhar sou eu que estou enganado e que estou a desvalorizar a criminalidade existente...talvez. mesmo assim, não me deixo embarcar na onda da condenação (politicamente correcta), simples, sem deixar de (politicamente incorrecto) não esquecer outras razões que agora, nestes tempos, parecem absurdas de dizer.
sinceramente não percebo porque sendo esta uma opinião, tão certa ou errada, como qualquer outra, possa ser interpretada como uma critica pessoal.
14 de agosto de 2008 às 07:50
Obviamente que não entendi como critica pessoal, apenas referi o facto de não me considerar alvo da tua observação porque, como é evidente... estou de acordo - e não me custa sublinhar isso - com o que escreveste. Eventualmente posso valorizar mais ou menos as situações em concreto, mas isso evidentemente não é divergência.
Quanto à selecção das leituras, secções dos jornais, também me recuso a ler as mesmas a que fazes referências, mas isto não é de hoje, digamos que é assim desde que me conheço como gente e com preocupações de âmbito social.
Esta questão do país parecer o "24 Horas" não me surpreende... mas incomoda-me. Apoquenta-me pura e simplesmente. Como me apoquenta que o futebol e a criminologia invariavelmente façam a abertura dos telejornais.
José Carrilho
22 de agosto de 2008 às 19:55
é só merda!